segunda-feira, 5 de setembro de 2011

O que é Filosofia?


A resposta a pergunta, “O que é filosofia?”, num primeiro olhar, se estabelece difícil de ser respondida. A proposta corrente que tem ecoado de forma persistem nos meios acadêmicos e literários, pelo menos em minhas observações, tem um tom de paradoxo. Mesmo assim, não gostaria de fazer uma crítica negativa a priori desta resposta, pois, talvez em uma análise mais apurada possamos achar coerência filosófica neste paradoxo lingüístico, que dado sozinho cheira como um argumento insuficiente. Pois bem, minha primeira resposta trata de tornar sinônimos o substantivo “filosofia” e sua forma verbal, o “filosofar”. Outra forma de responder a essa questão, a qual, devido certamente a minha paixão pelo estudo filosófico, não me agrada muito, mas infelizmente na maioria das vezes é aplicada aos filósofos, (aqui tratarei como filosofo o profissional graduado em filosofia) é a que classifica a filosofia como um ofício puramente técnico que é desenvolvido nos meios acadêmicos – no ensino, na pesquisa, ou na extensão – ou simplesmente por professores da educação básica. Sendo a idéia inicial deste trabalho dissertar sobre a visão pessoal do conceito filosofia, tentarei a seguir unir minhas impressões a respeito do termo com a primeira resposta proposta, deixando de lado a segunda opção por motivos já expostos.
Em minha opinião a filosofia deve estar de mãos dadas com a curiosidade, portanto não deve abrir espaço para o engessamento do pensar. Daí vem o primeiro objetivo da filosofia, a fuga do dogmatismo. Em sua empreitada inicial a filosofia estabelece uma desconstrução do conhecimento, ou melhor, do conhecimento aparente, e neste processo traz a luz outro termo que a meu ver é importantíssimo e que se mostra fundamental a perpetuação do pensar do filósofo, pois é ele que move a manivela que nunca cessa de girar: o “espanto”. É o espanto que mantêm a curiosidade epistemológica sempre viva, sendo – utilizando vocábulos modernos – um movimento psicológico, que faz com que o homem mantenha sua incessante busca.
Na desconstrução do conhecimento aparente, o filosofo pode estabelecer que dois ou mais argumentos concorrentes tenham a mesma valia, caindo assim, nas garras do relativismo ou do ceticismo. Desta forma a filosofia chega a uma encruzilhada, pois, ao abandonar o dogmatismo fixou-se por linhas tortas duas saídas que não condizem com a opção filosófica: o ceticismo, que diz que não é possível afirmar, nas condições acima citadas, qual argumento demonstra conhecimento, e o relativismo epistêmico, que procura mostrar que todos os argumentos são válidos. O filósofo deve descartar qualquer uma dessas saídas, visto que ser cético é o mesmo que abandonar a busca e ser relativista torna a busca algo sem razão. Abandonar também devido ao fato de as escolhas apresentadas serem incapazes de terem relevância prática. E até manifestam-se como inviáveis para as necessidades da vida cotidiana, sendo que, a meu ver, a filosofia deve permanecer num diálogo contínuo com a realidade prática e aprender com ela.’
Portanto em sua busca que culmina na desconstrução epistemológica e em seguida na encruzilhada cética-relativista o filósofo deverá dar um salto em busca da verdade, no entanto este novo conhecimento deve ser eternamente posto a prova e, na medida em que for possível, desconstruído novamente, num ciclo contínuo, tornando a filosofia uma prática, uma ação, seja do pensar, seja na apreensão da realidade. Agora sim podemos entender a primeira resposta apresentada, em que a filosofia é o filosofar, pois o filosofar é a ação que gera a filosofia e a filosofia é algo intrínseco desde processo.

terça-feira, 26 de abril de 2011

O Pseudo-Sexualismo

Poderão dizer que o tema objeto de meu texto de hoje seja polêmico, mas acredito que não é mais polêmico do que muitos outros já tratados neste blog; no entanto admito que sobre este tema, não tenho tanto conhecimento quanto os demais. Com isso não quero dizer que eu seja um especialista em todos os outros assuntos tratados aqui, muito pelo contrário; o que proponho e sempre propus, mesmo que não abertamente até agora, é seguir uma tradição de textos livres, de opinião e intuição, sem deixar de serem filosóficos, por mais que tenham baixa propriedade técnica, a qual sigo com grande admiração – mas, é claro, lembrando a ressalva válida a qualidade literária – a Bertrand Russell. Prometo que em postagens posteriores trarei de explicar melhor esta tradição, da qual, livremente e de forma abusada tento fazer parte.

Quero mais uma vez reforçar minha incapacidade de referenciar tecnicamente o texto a seguir, portanto buscarei ser mais sucinto e direto que outros já escritos.
Pois bem.
“O que tratarei é da sexualidade. Ou será da opção sexual? Não sei.”
Usei esta frase de introdução para mostrar minha ignorância, no entanto pretendo acabar sendo claro em minha opinião. E minha opinião é a seguinte: parece-me que a questão de opção sexual, ou melhor, a necessidade de escolhermos uma opção entre tantas, é algo ridículo e não aplicável a vida saudável. Para ser mais claro: heterossexualismo, homossexualismo, bissexualismo, transexualismo, e tantas outras opções (serão mesmo opções?) mais obscuras, mas não menos relevantes, para mim apresentam-se como brutalidades a nossa liberdade sexual e frutos de uma tradição discriminatória que mesmo com movimentos modernos de tolerância acabam mantendo-se em voga.

O objeto aqui é: porque simplesmente não tratamos nossas diferenças (ou serão igualdades?), mesmo que ocultas, apenas por sexualidade? Quero dizer que o ser humano não é levado de modo inato a definição por uma das formas supracitadas. Bem como, numa visão existencialista, torna-se muito mais claro a não necessidade de taxação aos moldes atuais.
Minha opinião é a de que sejamos todos “sexuáveis”, não limitando-nos a clichês e padrões pré-estabelecidos. Acredito que quanto mais livres tornemo-nos, mais feliz seremos neste pequeno, mas importante fator de nossas vidas, a chamada vida sexual.

Cristãos e outros religiosos me tratarão com repulsa, bem como alguns cientistas dogmáticos, mas parece-me claro que enquanto ainda entenda que nossa vida é formada por nós mesmo e o que é inato limita-se em especial ao físico, não ao psíquico, a formação de nossas experiências deve estar aberta, sempre é claro, com a devida responsabilidade para conosco e com o engajamento proposta à humanidade. Portanto discursos tradicionalistas e limitadores embasados em crenças não comprovadas, ou ao menos com justificativas fracas, como no caso da ciência dogmática, devem ser deixados de lado, em prol de nós mesmos e de uma provável e possível feliz mudança sócio-comportamental.

sábado, 2 de abril de 2011

Black Swan - O Belo E A Moral


Assistir, discutir e estudar cinema a muito tempo são coisas que me dão extremo prazer. Ultimamente venho falando muito sobre filosofia, devido a meus estudos e a importância que a meu ver este assunto demanda. Para esta postagem tentarei unir as duas discussões, mas com uma inclinação a minha paixão supracitada, o cinema. É importante lembrar que a estética, o belo, as artes, são temas recorrentes na filosofia, portanto de certo modo, para um discurso correto e com propriedade, fica difícil falar de artes em geral sem falar ao mesmo tempo de filosofia. Não pretendo abordar com profundidade um tema que persigo com entusiasmo, que diz respeito a que tipo de cinema – ou como o cineasta e teórico Robert Bresson prefere chamar, cinematógrafo – é arte e não apenas uma representação comercial – o teatro fotografado de Bresson. Tratarei de uma nuance menos complexa, mas em contrapartida não menos importante.
Para isso tomemos o filme, diga-se de passagem, com grande apelo comercial, Cisne Negro (Black Swan) 2010 do ótimo cineasta America Darren Aronofsky, um dos melhores de sua geração. Este filme é exemplo de direção competente, uma verdadeira aula. Belíssimo em toda sua técnica e inovador em sua forma, mesmo se tratando de uma espécie de exacerbação do teatro fotografado de Bresson. Exatamente por assim o ser, exagerar – neste caso o exagero é bem vindo – em sua estética, é que a obra se torna tão única e provocadora.
Por outro lado a discussão e a controvérsia gerada por sua temática, seu roteiro, é digna de nota. Falo sobre a forma que foi apresentado ao público o trabalho dos bailarinos de primeira grandeza, talvez – não posso entrar no mérito da causa por puro desconhecimento – exagerando, desta vez, a dificuldade, o martírio e o pressão exercida sobre estes profissionais. Ouvi e ainda ouço inúmeros formadores de opinião e/ou repetidores delas, vistos em meu dia-a-dia ,contestando a forma que a arte da dança foi mostrada, forma que para estes distorce a realidade, portanto celebrando uma mentira.
Infelizmente meus caros, sinto dizer-lhes, estão todos equivocados . Parafraseando Schopenhauer, “os amantes e os românticos podem contestar minhas teorias, mas as suas criticas não procedem”. Neste caso o que não procede é o triste discurso do moralista de plantão – assim mesmo, com a utilização deste clichê. Até entendo as implicações éticas que qualquer obra artística deve considerar, mas no caso de Black Swan, não posso deixar de enaltecer o filme em prol de uma mera picuinha vinda de ignorantes, no que diz respeito a cultura cinematográfica. Essa briga é mais uma prova da necessidade de todas as pessoas em uma sociedade que se diga evoluída, democrática e participativa, obterem máximo de informação cultural, possível nas mais diversas áreas do conhecimento. Somente assim uma disputa retórica poderá ser nivelada e evoluir para um consenso. Se não for desta forma, ficaremos fadados ao mero discurso ideológico.
No caso do filme em questão é necessário dizer que sua representatividade como uma espécie de mini-vanguarda cinematográfica torna-se muito mais relevante que a controvérsia gerada por ele. Além disso, se não fosse por seu roteiro, em inteira concordância com a estética utilizada, a obra não seria tão grande, coesa e perfeita. Por fim, meu pedido, meu desejo, é que tornemo-nos mais sábios e isso implica não somente na obtenção do conhecimento, mas também na idéia lógica de que somente devemos utilizarmos o principio de contestação, de crítica, na medida que tenhamos plena ciência do que falamos, que estejamos convictos de nossa possibilidade de defesa. A possibilidade de defesa não quer dizer que vencermos o discurso previamente, mas que compreendemos o problema por completo, não somente no que diz respeito a nossa posição. Assim avançaremos em uma discussão onde certamente a verdade e o consenso surgiram.

domingo, 27 de março de 2011

Verdade, Conhecimento e Discurso

Neste texto tentarei apresentar rapidamente três temas que a meu ver são, nos dias de atuais, banalizados e menosprezados em nossa sociedade: Verdade, Conhecimento e Discurso.

A ligação entre os dois primeiros temas citados, Verdade e Conhecimento, parece lógica, e realmente é. Para começar lembremos que uma determinada sentença para ser considerada Conhecimento, conforme primeiramente mostrado por Platão e hoje em dia visto em uma perspectiva padrão, ou seja, pelo próprio senso comum, deve satisfazer três condições: uma crença deve ser justificada por uma teoria e admitida como verdade por uma evidência. Portanto, a crença, a justificação e a verdade deverão coexistir para que o a sentença seja tida como um conhecimento.
Este tipo de procedimento apresenta muitos problemas, os quais são objetos de critica a filosófica Platônica, visto que para o filósofo encontrar a evidencia, muitas vezes deixava-se o universo sensível e passava ao universo das formas, tornando sua doutrina menos prática. A evidência que torna a crença verdadeira normalmente só era encontrada via metafísica, ou seja, a verdade seria algo para os deuses.

É nesta crítica que muitos ceticistas se baseiam ao apresentarem teorias que minimizam nossa capacidade de encontrar a verdade e chegam a somente a admitir que um conhecimento verdadeiro esteja em sentenças auto-evidentes – onde a evidencia se apresenta na própria sentença – tais como “2+2=4” ou “A=A”.
Entretanto mesmo que aceitarmos a dificuldade de acreditar em certas verdades menos palpáveis, não podemos deixar de reconhecer que algumas crenças podem ser tidas como conhecimento apenas por serem justificadas. Temos, nestes casos, por exemplo a “gravidade”, que é justificada por todo um estudo experimental que nos dá uma certa segurança, visto que abrangendo eventos passados esta crença não dá a certeza para eventos futuros. A justificativa se apresenta em uma teoria que não pode ser tida como verdadeira, em especial segundo um olhar cético.

Por outro lado, o ceticista nos dirá: nos não temos certeza de praticamente nada; não conhecemos nada; mas para termos uma saída racional, entendemos que algumas justificações são mais fortes que outras, portanto devemos tomar atitudes baseadas na provável verdade que estas crenças apresentam.
Aqui está demonstrar a dificuldade de encontrarmos um conhecimento teórico ou prático, com o mínimo de complexidade, onde a verdade seja evidenciada. Portanto vejo com ressalvas os inúmeros discursos apresentados das mais diversas formas, onde agentes dos discursos agem como donos da verdade, aos moldes de um neo-platonismo. Tenho certeza que grande parte deste pseudo-sábios tem noção de seu erro quanto a falta de veracidade em seus discursos, mas o fazem pelo poder da alienação e subjugação social.

Visto a impossibilidade de alcançarmos a verdade, em um sentido restrito, parece-me que a disputa pelo poder não mais se dá no campo da discussão de quem tem o dom da persuasão, da retórica ou até mesmo da erística. Não obstante, o confronto se dá a priori, portanto através de possibilidade de realizar os discursos. Melhor entendido, o poder será de quem tiver a capacidade de discursar e para isso, no mundo capitalista, nada melhor que a mídia comercial, e no âmbito político nada como a alienação pela panfletagem populista. Lembrando que, no caso, os dois sistemas são um a extensão do outro.

Para finalizar gostaria de deixar a sugestão de um texto que escrevi sobre as possibilidades da democratização do discurso pela internet. Este baseado em uma releitura de Foucault.

Notas Sobre Um Paradigma da Informação


segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Terceiro Setor Contra a Escola Capitalista


Resolvi, desta vez, escrever um texto menos filosófico e mais prático. Não que a prática não faça parte da filosofia, ao contrário; é só vermos, por exemplo, a corrente do Pragmatismo ou mesmo o sentido filosófico de Práxis. Fui impulsionado pela leitura de alguns artigos recentemente estudados sobre as possibilidades do terceiro setor e sobre as impossibilidades de uma educação libertária em uma sociedade capitalista.
Vou tentar explicar simplificadamente a incoerência que, no meu entendimento, se apresenta ao estudarmos as duas afirmações acima citadas.

Começarei pela idéia de que em uma sociedade capitalista a educação libertária nunca acontecerá. Muitos teóricos comunistas, em especial Gramsci, utilizando, é claro, os trabalhos de Marx, evocando sua correta concepção de Ideologia, nos dizem que a escola enquanto um aparelho ideológico do Estado nunca desenvolverá trabalhos que irão contra seus interesses. Para ser mais claro, isso quer dizer que num país capitalista a escola é  claramente utilizada visando dois objetivos: primeiramente para o desenvolvimento de mão-de-obra para as necessidades do mercado de trabalho e em seguida para disseminação de conteúdo de alienação em favor da perpetuação da ideologia dominante. Para a maioria dos marxistas seria preciso que primeiro houvesse uma mudança de estrutura econômica e política para o comunismo que em seguida aconteceria à reformulação na pedagogia utilizada nas escolas.

Vejo estas conclusões por dois lados, o lado correto ao mostrar a realidade de nossas escolas e o lado oportunista e contraditório dos comunistas. Contra os comunistas pesa a já consagrada sede pela revolução, ou seja, ao mostrarem as impossibilidades pedagógicas nas escolas capitalistas eles mais uma vez defendem a imediata revolução; e aí me parece morar o oportunismo.  Outro ponto está na contradição, onde não fica claro que ao mudarmos a forma de governo a educação tornar-se-á libertaria por conseqüência; para mim é exatamente o contrário, a mudança da ditadura burguesa para ditadura do proletariado somente resultará em novos donos do poder ideológico, onde a verdadeira libertação também não acontecerá.
O lado correto está na evidenciação de que enquanto a escola estiver sobre o domínio do Estado, a meu ver independentemente da forma de governo, ela sempre será usada como aparelho ideológico.

A partir desta relação, pensando na posição do terceiro setor em nossa sociedade, aonde muitas das obrigações do governo vem sendo passadas para a iniciativa de ONGs (Organizações Não Governamentais), tais como, saúde, disseminação cultural, inclusão social e até mesmo educação; vemos uma oportunidade. As ONGs enquanto mantiverem suas finalidades publicas e sem fins lucrativos, geralmente, mobilizando a opinião pública e o apoio da população para modificar determinados aspectos da sociedade, são uma esperança para a alteração da estrutura pedagógica tradicional para as teorias libertárias; visto que estas organizações podem complementar o trabalho do Estado, realizando ações onde ele não consegue chegar.

Mesmo que em uma estrutura como a de nosso país, onde fica difícil imaginarmos toda a educação desenvolvida pelo terceiro setor, vemos que a refutação da idéia comunista é pertinente. Pois, se o principal argumento em defesa da revolução primeira é que a escola é um aparelho ideológico do Estado, percebe-se que se a educação não está mais nas mãos do Estado existe a possibilidade de mudança mesmo numa sociedade capitalista.

Este argumento vem em defesa de algumas teorias anarquistas, onde a revolução, ao contrario do comunismo, acontece de baixo para cima, ou seja, mudando primeiramente a consciência geral da população, desalienando, evocando a dialética e não a figura do rei filósofo platônico, conforme as idéias comunistas, onde quem tem a sabedoria exerceria a revolução tornando a população em geral apenas máquina de manobra.

Na concepção que defendo, a mudança começa pelo povo, não pelo Estado, pela educação, não pela revolução. É claro que dirão que mesmo as ONGs, como se apresentam hoje em dia, ainda assim podem vir a ser máquinas de alienação, mas não há como refutar o argumento de que elas podem tornar-se um meio viável de mudança, e de mudança pelo desenvolvimento do pensamento crítico por meio da educação libertária a margem da ideologia dominante e do Estado, com a sociedade civil tomando as rédeas de seu próprio futuro.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Assim é a vida do homem vista de fora – Por que Sustentabilidade?

Russell escreveu antes de mim um texto com o qual eu usaria para questionar essa nova (quase velha) onda chamada Sustentabilidade.
Com os mesmo argumentos, visando apresentar a pequenez humana, discursaria sobre qual o sentido de podarmos alguns de nossos desejos em prol de uma, duas ou dez gerações a mais de nossa sociedade; visto que mesmo com a utilização de um sem número de artinhas, um dia nosso fim inevitavelmente chegará.
Fiquem com o sempre bem escrito texto de Russell.

“Os sonhos de um homem ou de um grupo podem ser cômicos, mas os sonhos humanos coletivos, para nós que não podemos ultrapassar o círculo da humanidade, são patéticos. O universo é muito vasto, como revela a astronomia. Não podemos dizer o que existe além do que os telescópios mostram. Mas sabemos que é de uma imensidão inimaginável. No mundo visível, a Via Láctea é um fragmento minúsculo; e, nesse fragmento, o sistema solar é uma partícula infinitesimal, e, dessa partícula, nosso planeta é um ponto microscópico. Nesse ponto, pequenas massas impuras de carbono e água, de estrutura complexa, com algumas raras propriedades físicas e químicas, arrastam-se por alguns anos, até serem dissolvidas outra vez nos elementos de que são compostas. Elas dividem seu tempo entre o trabalho designado para adiar o momento de sua dissolução e a luta frenética para acelerar o de outras do mesmo tipo. As convulsões naturais destroem periodicamente milhares ou milhões delas, e a doença devasta, de modo prematuro, mais algumas. Esses eventos são considerados infortúnios; mas quando os homens obtêm êxito ao impor semelhante destruição por seus próprios esforços, regozijam-se e agradecem a Deus. Na vida do sistema solar, o período no qual a existência do homem terá sido fisicamente possível é uma porção minúscula do todo; mas existe alguma razão para esperar que mesmo antes desse período terminar o homem tenha posto fim à sua existência por seus próprios meios de aniquilação mútua. Assim é a vida do homem vista de fora.”

Nosso pensador usou este texto, que é parte integrante do livro “Ensaios Céticos”,  uma coletânea de ensaios, a maioria dos quais escritos nos anos 20, sobre os mais diversos assuntos e que continuam como polêmicas de nosso tempo, para defender sua posição contra a insanidade humana ao usar mitos para basear suas condutas.
Por mais diferentes que sejam nossos enfoques, temos algo em comum, a defesa do ceticismo. Quero deixar claro que mesmo que eu tenha alguma dúvida quanto ao nível de influência humana nos acontecimentos da natureza que vem sendo relatados pela mídia especializada ou não, ainda assim meu ceticismo estaria na pergunta, “por que sustentabilidade?” e não na afirmação – que aparentemente está errada – de que o homem pouco influi nesses acontecimentos.
Conforme o próprio Russell nos diz, para resolver o problema que nos é apresentado ao vermos o homem de fora, a humanidade apelou para a religião e a filosofia.
Para seguir a filosofia ceticista descartemos a religião em nossas exposições, abdicando no mito. Tomemos então a filosofia como base. Ela pelos mais diversos meios, seja, de forma humanista, materialista ou idealista, entre outras, responderá mais ou menos satisfatoriamente, evocando a necessidade de perpetuação da raça humana e a dignificação da vida; mas queira ou não, sempre baseada em crenças. Aí mora o grande problema, ao basear-se em crenças, normalmente o homem acaba cedendo ao imediatismo de sua vida cotidiana.
Hoje me parece que a sustentabilidade se insere neste imediatismo nas necessidades capitalista de demonstração da responsabilidade social e ambiental tanto do primeiro, segundo e terceiro setores da economia. As inclinações realmente filosóficas são deixadas em segundo plano, ou seja, os homens acabam guiados por suas necessidades imediatas e não no pensamento de uma sociedade a longo prazo, o que daria o sentido ético a questão.
Não quero aqui condenar a sustentabilidade, mesmo que ache que a tomada total e sem discussão de suas práticas, como é feito ultimamente, podem tornar em alguns casos a vida do homem mais triste, algo que é indesejável; mas quero sim, atentar para a utilização em massa de um conceito filosófico em prol de ganhos, não de ganhos a humanidade como um todo, mas a economia capitalista, economia que somente sede aos meios sustentáveis até onde vai seu interesse.

O Sistema de Copérnico - Quando a Terra perdeu a posição central, girando em torno do Sol, também o homem foi deposto de sua eminência.
Referências:
RUSSELL, Bertrand. Ensaios Céticos,  Pág. 32-33, Tradução de Marisa Motta. Porto Alegre, LP&M, 2010

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Recompensas e Punições - Analisando Um Erro de Russell

“Nosso ato provém diretamente do desejo de atingir um determinado fim, não menos que do conhecimento dos meios necessários para tanto. Isso se aplica igualmente a todos os atos, sejam eles bons ou maus. Os fins diferem, e o conhecimento é mais adequando em alguns casos do que noutros. Entretanto, não há maneira concebível de levar as pessoas a fazerem coisas que não desejam. Possível é modificar seus desejos por meio de um sistema de recompensas e punições, entre as quais a aprovação e desaprovação social não sejam menos poderosas." (pg 53)

RUSSELL, Bertrand. No que acredito. L&M Pocket, Porto Alegre, RS: 2010.
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Transpondo esse ideal sistemático de recompensas e punições, para modificar nossos desejos, citado por Russell, ao sistema educacional, encontramos sua manifestação na escola tradicional do início do século XX, embasada pela nova ciência psicológica behaviorista (comportamento). Ou seja, o aluno recebia estímulos para realizar uma tarefa e ganhava recompensas se a executasse. Se houvesse erro, desobediência, ou qualquer ato inadequado, o aluno era punido até mudar sua conduta e não cometer o mesmo erro novamente. Daí que surge o massivo método de repetição usado até hoje, para fixação de condutas adequadas, de aprendizagem conteúdista. Essa questão nos remete ao condicionamento humano, (ver Skinner), por exemplo, o cachorro saliva quando está com fome, é dado um choque no animal, ele saliva e fica com fome. Ou seja, um comportamento gera uma resposta que gera uma conseqüência.  O estímulo não corresponde ao fim, seus desejos são condicionados. Outro grande exemplo vem da literatura, na obra “Laranja Mecânica” de Anthony Burgess (1962), em que o protagonista Alex, depois de tanto cometer atos maldosos, foi condicionado a não cometê-los novamente, toda vez que pensava em agredir, sentia-se enjoado e não realizava seus atos. Segundo Russell, é possível modificar os desejos através de um sistema de recompensas e punições. Carl Rogers faz uma crítica ao modelo psicológico de Skinner, para ele Skinner “privilegia conceitos como controle e previsibilidade, e dá pouco valor a conceitos como liberdade e realização pessoal. A abordagem de Rogers considera o modelo de educação e controle de comportamento de Skinner excessivamente mecanicista e determinista.”


Giorgia de Oliveira Moreira
@giorgiadoors
giorgiamoreira@hotmail.com

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Tempos Modernos


Existe um grande movimento, encabeçado por nossa presidente da república, em favor da educação no país. No seu primeiro pronunciamento em rede nacional após a posse, a substituta de “nosso salvador” elegeu exatamente essa temática para discutir, apresentando suas propostas, e claro, sem esquecer-se de mencionar sua legítima luta contra a miséria.

Com seu plano, o qual foca em escolas técnicas, com abertura de novas instituições e financiamento de estudo ao molde das bolsas do ProUni, vê-se claramente uma retomada da já ultrapassada educação tecnicista, a qual vigorou no Brasil em especial nas décadas da ditadura.
Há diversas explicações, diga-se de passagem, muito claras, a respeito dessa preocupação, tais como, a extrema necessidade de mão-de-obra por parte do mercado de trabalho nacional; as centenas de milhares (milhões) de cidadãos disponíveis para ingressarem neste mercado, com o intuito de obterem rendimentos maiores, mas que antes precisam qualificar-se; a degradação, apontada há anos, em nossas escolas públicas; e por conseqüência disso, o desnível entre estudantes formados em escolas públicas e escolas privadas. Poderíamos continuar a lista, mas nos limitaremos as estes fatores.

Torna-se claro que se estes planos funcionarem, o ganho econômico e social será de grande valia à nossa população, ou seja, a medida que desenvolvo a educação de grande parte de uma nação, estarei atendendo as demandas do mercado de trabalho, e atendendo meu próprio povo. Resultado: desenvolvimento econômico; ganho no PIB; aumento do nível de renda; aumento do grau de escolaridade média; possível erradicação, muito bem vinda e tão almejada, da miséria; entre outros desdobramentos decorrentes destes.

Sem querer ser pessimista, mas atentando para as possibilidades, sabemos que este crescimento, ou melhor, desenvolvimento das infra-instruturas de nosso país, o qual é bastante necessário, não vai durar para sempre. Desta forma, o consumismo pregado em nossa sociedade, que só tende a crescer com o ganho educacional e de capital, não sustentará nossa economia. Digo isso observando as causas da ultima grande crise mundial, mas como mera especulação. Possivelmente este tema será objeto de uma postagem neste blog daqui há alguns anos.
Mantendo a perspectiva que alguns chamarão de pessimista, é importante lembrar que numa economia capitalista o preço é regulado pela oferta e demanda, portanto é provável que profissões que hoje pagam bem devido a falta de profissionais, daqui a alguns anos com o aumento da oferta destes no mercado de trabalho, o valor do salário tenda a cair.

Por fim cheguei a meu dilema: citando o romancista, dramaturgo e talvez mais importante filósofo do século XX, Jean-Paul Sartre "me posiciono do lado daqueles que querem mudar tanto a condição social do homem quanto a concepção que ele tem de si mesmo”(1946). O quero dizer com isso? Utilizando o ideário pedagógico dialético do pensador brasileiro Demerval Saviani (1986) gostaria de demonstrar que a escola não é lugar de criação de meras máquinas para o mercado de trabalho. A educação que deveria ser o instrumento para as escolhas do homem livre, democrático, cidadão e autônomo acaba, então se tornando mais uma ferramenta de manipulação e de minimização do pensamento crítico na sociedade. Ela legitima as diferenças sociais e marginaliza, ao invés de tencionar a luta contra a ideologia das classes dominantes, e dos direitos dos seres humanos: o conhecimento, que deve ser universal e possibilitado a todos.

Com essa análise, a crítica à escola tecnicista me parece simples e viável, pois conforme nosso teórico, o que devemos visar na relação entre a educação e a sociedade é a responsabilidade dos professores em transformar, não o mundo, mas sim cada indivíduo que assiste sua aula,  ajudando-o a compreender melhor os acontecimentos como um todo, assim como seu papel dentro do sistema, seus deveres e seus direitos. Somente desta forma é que construiremos o já anunciado, e a meu ver de modo equivocado, “país melhor”.


sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Notas Sobre Um Paradigma Da Informação

Nos dias atuais as aparências apresentam uma situação singular, não mais como o "fim de um sonho", comum aos anos setenta, com o fim do toda contracultura “sessentista”, mas podemos dizer, com um olhar superficial da sociedade, que já vivemos o início de um pesadelo. Falo daquele pensamento revolucionário de mudança social, política e econômica, por certo um desejo de transformação generalizada e em contexto mundial.
É comum vermos as pessoas que ainda cultivam esses ideais reclamarem por sentirem-se sozinhas em meio à maioria esmagadora que está entregue aos encantos da vida capitalista.
Uma pergunta sobre este tema foi parte integrante do texto em forma de entrevista elaborado (tanto as perguntas quanto as respostas) pelo filósofo francês Michel Foucault e por C. Delacampagne representante do jornal “Le Monde”, que encomendou o texto. O título foi “Le Philosophe masqué” (O filosofo mascarado), publicado em 06 de abril de 1980.
Foucault que solicitou não ser identificado na entrevista, por isso o título, respondeu a seguinte pergunta: “Você acredita que nossa época está realmente sem espíritos à altura dos seus problemas e dos grandes escritores?”
Vê-se que o problema já era relevante no início da década de 80 e sobre ele o pensador francês respondeu, de forma contraditória, que não acreditava no “refrão da decadência, da ausência de escritores, da esterilidade do pensamento, do horizonte negro e tétrico”. Exaltando a capacidade humana de manifestar a curiosidade, Foucault parece esquecer, mas penso que de forma intencional, com o intuito de destacar outro problema que tratarei em seguida, que nossa sociedade está absorvida pelo senso comum e pelo que Paulo Freire chama de “curiosidade ingênua”.
Não vou entrar no mérito do que é curiosidade ingênua, mas torna-se claro que ela é o que caracteriza o senso comum e dela resulta certo saber, mas sim, quero discutir o que é definido por Freire como “curiosidade epistemológica”, que é exatamente a curiosidade que Foucault destaca em seu texto. Esta caracteriza-se por ser mais metódica e mais rigorosa que a primeira, portanto uma curiosidade crítica por essência.
Ao exaltar a existência do pensamento crítico em nossa sociedade, algo que acredito que nos trinta anos passados diminuiu significativamente, Foucault procura nos alertar de outro mal, a minimização dos meios de disseminar-se informação. Segundo ele o “problema consiste em multiplicar os canais, as passarelas, os meios de informação, as redes televisivas e as radiofônicas, os jornais.”
Partindo deste principio necessário ao desenvolvimento da consciência humana, vemos já há algum tempo que a internet, as possibilidades abertas pela TI, podem tornar esses meios mais democráticos. No entanto, conforme John A. Mathews mostra em seu famoso artigo “New production concepts” (Novos conceitos de produção) de 1999, o qual discursa sobre a eminente mudança de paradigma de produção, essas novas ferramentas podem ser usadas para disseminar informação com o intuito de obter-se uma produção sustentável e flexível que deve ir além da organização do trabalho, passando pela mudança de aspectos técnicos, econômicos, políticos e sociais, ou simplesmente para automatização contínua de sistemas produtivos sem mudança na essência da organização do trabalho. Analogamente a esse conceito, vemos um dilema, utilizar a TI para verdadeiramente democratizar a informação, como pretende Foucault, ou para meramente intensificar a de caráter ingênuo, de marketing e visando a perpetuação do capitalismo exacerbado.
Para Foucault deve-se evitar “chamar mídia os canais de informação aos quais não se pode ou não se quer ter acesso” e a internet, diferentemente da maioria dos meios clássicos de mídia moderna, atente a este quesito. Portanto acho legítima a utilização da mesma, seja para pequenas ações, como o chamado “tuitaço”, por entender que é hora de a utilizarmos para o fim coerente com nosso sonho citado no começo do texto.
Gostaria de destacar mais uma frase do filósofo mascarado.

“Sonho com uma nova idade da curiosidade. Os meios técnicos existem; o desejo existe; as coisas a conhecer são infinitas; as pessoas que podem empenhar-se nesta tarefa existem. De que então sofremos? De escassez: canais estreitos, exíguos, quase monopolistas, insuficientes.” (Michel Foucault)

Fica agora a pergunta a ser respondida: Será que ainda sofremos desta escassez ou não sabemos utilizar os canais de informação disponíveis de forma coerente?


 Referências:

FOUCAULT, Michel. Archivio Foucault. Vol. 3. Estetica dell’esistenza, etica, politica. A cura di Alessandro Pandolfi. Milano, Feltrinelli, 1994, pp. 137-144. Tradução portuguesa de Selvino José Assmann. Fpolis, setembro de 2000.

MATHEWS, John A. New Production Concepts. Prometheus, Vol. 7. No. 1, Junho de 1999.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia, São Paulo, Paz e Terra, 2010.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

3 Álbuns - Álbum 3

OS CONSAGRADOS

O “Show Opinião”, este é o terceiro álbum escolhido. Fechando a lista, este título representa os Consagrados da música brasileira. Gostaria de destacar algo de especial nos três artistas que juntos contribuíram para esta obra. Nara Leão, João do Vale e Zé Keti, mesmo sendo reconhecido por sua excelência artística não são muito conhecidos pelo grande público, pelo menos para as novas gerações e no abrangente de suas obras.
Venho aqui falar em especial do “Show Opinião”, que na época de seu lançamento tornou-se muito popular, isso em especial devido a ele ter surgido a partir de um espetáculo musical. Dirigido por Augusto Boal, produzido pelo Teatro de Arena e por integrantes do Centro Popular de Cultura da UNE - instituição que, a esta altura, havia sido colocada na ilegalidade pelo regime militar recentemente instaurado no Brasil.
Os três atores-cantores intercalavam canções a narrações referentes à problemática social do país. O texto era assinado por Armando Costa, Oduvaldo Vianna Filho e Paulo Pontes.
O show-manifesto estreou em 11 de dezembro de 1964, alguns meses depois do golpe militar, no teatro do Shopping Center Copacabana, sede do Teatro de Arena no Rio de Janeiro.
O show tornou-se uma referência na chamada "música de protesto" e é considerado um dos mais importantes da história da música popular brasileira.
O álbum de 1965 nada mais é que a gravação de um dos espetáculos apresentados.

 
3 Álbuns - Álbum 1 :

3 Álbuns - Álbum 2 :

3 Álbuns - Álbum 2

OS MALDITOS

Para caracterizar os Malditos da música brasileira escolhi o álbum “Alucinação” de 1976. É uma obra de um dos artistas mais subestimados de nossa arte musical, Belchior.
Muitas pessoas que adoram música “Como nossos pais”, interpretada lindamente pela grande Elis Regina nem imaginam que a composição é de Belchior. Esta música, bem como “Velha roupa colorida”, também interpretada pela Elis, fazem parte deste álbum do autor.
A obra e um verdadeiro manifesto político e social em forma de arte. Todas as canções tem letras extremamente bem escritas, e feitas para apresentar uma ideologia vinda do artista.
Com sua mistura sonora, temos um som com um toque de “brega”, típico de Belchior e a psicodelia que se apresenta logo na capa, contra-capa e encarte do disco.
Além das músicas supracitadas, podemos destacar também “Apenas um rapaz latino-americano”, “Sujeito de Sorte” e a faixa que dá o título do álbum, “Alucinação”.
Esta é uma obra obrigatória aos amantes da música popular brasileira e apreciadores de uma boa letra com cunho de protesto.


3 Álbuns - Álbum 1 :

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Anarquistas Também Amam (A Filosofia do Amor)

Boa noite amor,

Ontem quando me despedi de você e voltei para casa, fiquei pensando em nossa conversa, em nosso acordo, o qual, até certo ponto, pareceu-me forçado. Um acordo em que apresenta-se uma imposição não se torna justo, ele é sim um exercício de autoritarismo, e infelizmente neste caso vindo de minha parte.

Como anarquista, nem mesmo nas relações sociais, ou no caso amorosa, posso admitir este tipo de atitude, se aceitá-la não estarei sendo ético nem comigo, nem contigo.
Fiquei um bom tempo refletindo sobre o assunto sem conseguir chegar a uma conclusão que satisfizesse meu desejo de ter um pouco de paz de espírito e de ao mesmo tempo ser fiel a meus ideais.

A noite peguei o livro que estou lendo e logo na primeira página a resposta veio a tona, não para minha angústia, mas dizendo o por que dessa situação.

Pode parecer estranho mas as vezes pensamos que o estudo da filosofia só se apresenta na prática, ou como Práxis, no âmbito de filosofias políticas e sociais, mas ela é tão ou mais importante para nossas relações sociais, nosso dia-a-dia, e baseando-se nela pude entender melhor esse envolvimento, em especial no dilema que hoje tenho contigo.

 

Lembrando que nosso acordo diz respeito a limitação de nossa liberdade em favor de uma aparente relação mais tranquila, seja para mim seja para você, ao ler o trecho no livro onde o filosofo, dramaturgo e romancista francês Jean-Paul Sartre, velho conhecido nosso, expõem suas constatações sobre a liberdade e ou outrem, tive a visão da discussão que se impôs entre nós e a prova da inevitabilidade de tal tensão.

 

Essa relação de tensão existencial entre o eu e outrem, no caso entre nós, segundo Sartre é até onde pode ir a liberdade, visto que “o único limite com o qual pode se deparar a liberdade vem da relação com outrem”. Como pode ver, isso é algo inevitável em qualquer relacionamento, portanto não é exclusividade nossa.

Mas há, como podemos sentir em nosso coração, o lado podre desse estudo. Ao avançar no assunto Sartre por fim chega a triste conclusão: “Como só há escolha fenomênica e liberdade absoluta, não pode haver amor absoluto.”

 

Essa constatação apresentou-se para mim como o fim de um sonho, no entanto, um que já estava programado para expirar. Mas ainda há uma saída, e o filosofo, com uma aparente, mas só aparente, contradição, mostrou-me a resposta para minha angústia.

A resposta se evidencia quando nossa livre existência é retomada e desejada por uma liberdade absoluta que ela ao mesmo tempo condiciona e que nós mesmos desejamos livremente. Ou seja, “o fundo da alegria do amor, quando ela existe, é sentirmo-nos justificados por existir.”

 

Para nossa relação seria aceitar um acordo ou uma limitação da liberdade, mas não para satisfazer o outro, e sim para satisfazer nós mesmos.

 

Fica a pergunta: Isso é possível para nós?

 

Com carinho.

 

 

domingo, 23 de janeiro de 2011

A Culpa é de Quem? (Sobre as Tragédias)

Quando da tragédia que assolou Lisboa em 1755, os pensadores Voltaire e Rousseau travaram uma discussão em torno do que gosto de definir como “de quem é a culpa?”, ou seja, para Voltaire segundo seu poema sobre o desastre de Lisboa, mesmo que não explicitamente, a culpa seria de Deus, pois Ele sendo um ser benevolente e onipotente, não deveria permitir tal acontecimento a humanidade. Já para Rousseau a culpa não é de Deus, visto que são os homens que se amontoam em um espaço reduzido propensos a esse tipo de fato.

Uma discussão dessas me parece sem fim, mas queria atentar para outra observação importante de Voltaire em seu texto. Ele parece não aceitar que Deus é ao mesmo tempo benevolente e onipotente, pois se Ele permite tal flagelo, não é benevolente, ou se realmente o for, então não será onipotente, pois não é capaz de impedí-lo.
Venho, com esta observação, não defender o ateísmo, mesmo como ateu que sou, mas para demonstrar minha revolta com essa estagnação do pensamento. Por exemplo: ao ver o noticiário, onde apresentam um mundo de tragédias sem fim, ou, um sem fim de tragédias no mundo, em especial nos últimos dias com as enchentes no Brasil, por várias vezes assisto, diferentes pessoas, vítimas, se colocando como meros fantoches, ao declarem, quando do recebimento de uma ajuda – seja por parte do governo, de filantropos, de voluntários, de vizinhos – muito satisfeitos, agradecendo a Deus pela ajuda bem vinda, mas mesmo que sem esquecerem de tudo que os aconteceu, aparentemente aceitam tal situação como sendo algo da natureza, do desejo divino, sem a menor contestação. Essa aceitação das regras divinas nos remetem a uma mesma aceitação do jogo dos homens, dos termos definidos pela elite dominante, pelo governo hipócrita, pelos discursos alienantes – políticos ou teológicos.

A mesma pergunta que podemos fazer a um Deus que segundo consta é benevolente e onipotente, mas aparece-nos como indiferente esses tristes acontecimentos: “que Deus é esse?”; podemos fazer a nossos representantes, as “vozes do povo”, que não tomam providências para evitar esse infortúnios: “que governo é esse?”. Como já enfatizei muitas vezes em textos anteriores, para mim essas providências devem partir da educação, pois se os homens que construíram casas de 6 andares a beira mar em Lisboa no século XVIII tivessem uma educação coerente (sem entrar desta vez no mérito de o que é educação coerente), eles com certeza, não teriam as feito, pois estariam cientes das possibilidades e dos danos causados a natureza e em contra-partida ao próprio homem. É claro que possivelmente, para o homem do século XVIII, tais conhecimentos ainda precisavam ser desenvolvidos, mas para a realidade presente vejo possível. Entendo que só a ganancia desmedida, a ocupação sem nenhuma preocupação – com o natural, com o ambiente e com o habitat – é tão responsável pelas tragédia quanto o próprio Deus.

Portanto, a margem de Deus, somos seres capazes e devemos lutar por nossa integridade – seja física, seja mental – e essa luta deve partir de uma cobrança de nos mesmo e de nossos representantes, começando pela mudança do pensamos comum para pensamento crítico, o que resultará na evidenciação de necessárias ações civis a serem tomadas para evitar novos erros que se tornaram corriqueiros e até certo ponto são tolerádos em nossa sociedade.


sábado, 22 de janeiro de 2011

O que se entende por rock brasileiro?

Após várias discussões filosóficas, alucinógenas e espirituais – espirituais, devido a química, é claro! – acho que enfim compreendemos a ideia do que é o verdadeiro rock brasileiro.
A ideia inicial de renegar o que tem-se como indiscutívelmente rock nacional, tal como o sonho vindo de ”Os Mutantes” ou mesmo com o que é hoje é tido como “a década do rock” no Brasil, o que gostamos de chamar de “roquizinho dos anos 80”, pode ser difícil de aceitar, mas pelo nosso entendimento isso não é rock brasileiro.
Consideramos como o que há de melhor em termos de rock brasileiro “Os Novos Baianos”. Você pode me perguntar porque?
A resposta, o som é autêntico, é brasileiro, é de atitude, é ideologia, cultural, original, é expressão artística e também é rock. Ouvimos suas músicas e não nos remete a algum som ou uma estética pronta, estáticas em geral vinda de fora, importadas. Encontramos nesse som influências do rock e do samba, até mesmo baião, ultrapassando a invisível barreira cultural que na verdade não deveria existir, restringindo as posibilidades de criação para com  junção dessas vertentes musicais. Vemos sim a fusão delas para algo completo, singular. Ao apreciarmos este tipo de som temos certeza de que há identidade brasileira, como ocorreu com a “bossa nova” anos antes, onde o mundo nos promoveu a jazz, extrapolando nossas fronteiras. Assim é “Os Novos Baianos”, rock e samba igual a rock brasileiro.


PS: Para que compreendeu, ou quer saber mais, veja o vídeo indiaco abaixo. Compare com os mesmos critérios apresentados a banda Planet Hemp, pois ela também representa uma vanguarda musical genuinamente brasileira, bem como tente usar essa comparação para as bandas brasileiras que você gosta, então comente nos mostrando outros nomes.




Giorgia de Oliveira Moreira e Vinicius Nesi.
Joinville, janeiro de 2011.
Ao som de “Os Novos Baianos”, com alguns entorpecentes.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

"Ensinar exige liberdade e autoridade"

Texto retirado no livro "Pedagogia da Autonomia - Saberes Necessário a Prática Educativa" de Paulo Freire. Na parte 4 do capítulo 3 o autor nos apresenta a relação de tensão entre Autoridade e Liberdade. Relação que vejo necessária, e que deve estar presente, na medida certa, em grande parte das relações sociais do ser humano independente da filosofia política escolhida.


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Noutro momento deste texto me referi ao fato de não termos ainda resolvido o problema da tensão entre a autoridade e a liberdade. Inclinados a superar a tradição autoritária, tão presente entre nós resvalamos para formas licenciosas de comportamento e descobrimos autoritarismo onde só houve o exercício legítimo da autoridade.
Recentemente, jovem professor universitário, de opção democrática, comentava comigo o que lhe parecia ter sido um desvio seu no uso de sua autoridade. Disse, constrangido, ter se oposto a que aluno de outra classe continuasse na porta entreaberta de sua sala, a manter uma conversa gesticulada com uma das alunas. Ele tivera inclusive que parar sua fala em face do descompasso que a situação provocava. Para ele, sua decisão, com que devolvera ao espaço pedagógico o necessário clima para continuar sua atividade específica e com a qual restaurara o direito dos estudantes e o seu de prosseguir a prática docente, fora autoritária. Na verdade, não. Licencioso teria sido se tivesse permitido que a indisciplina de uma liberdade mal centrada desequilibrasse o contexto pedagógico, prejudicando assim o seu funcionamento.
Num dos inúmeros debates de que venho participando, e em que discutia precisamente a questão dos limites sem os quais a liberdade se perverte em licença e a autoridade em autoritarismo, ouvi de um dos participantes que, ao falar dos limites à liberdade eu estava repetindo a cantinela que caracterizava o discurso de professor seu, reconhecidamente reacionário, durante o regime militar. Pra o meu interlocutor, a liberdade estava acima de qualquer limite. Para mim, não exatamente porque aposto nela, porque sei que sem ela a existência só tem valor e sentido na luta em favor dela. A liberdade sem limite é tão negada quanto a liberdade asfixiada ou castrada.
O grande problema que se coloca ao educador ou à educadora de opção democrática é com trabalhar no sentido de fazer possível que a necessidade do limite seja assumida eticamente pela liberdade. Quanto mais criticamente a liberdade assuma o limite necessário tanto mais autoridade tem ela, eticamente falando, para continuar lutando em seu nome.
Gostaria uma vez mais de deixar bem expresso o quanto aposto na liberdade, o quanto me parece fundamental que ele se exercite assumindo decisões. Foi isso, pelo menos, o que marcou a minha experiência de filho, de irmão, de aluno, de professor, de marido, de pai e cidadão.
A liberdade amadurece no confronto com outras liberdades, na defesa de seus direitos em face da autoridade dos pais, do professor, do estado. É claro que, nem sempre, a liberdade do adolescente faz a melhor decisão com relação a seu amanhã. É indispensável que os pais tomem parte das discussões com os filhos em torno desse amanhã. Não podem nem devem omitir-se mas precisam saber e assumir, que o futuro de seus filhos é de seus filhos e não seu. É preferível, para min, reforçar o direito que tem a liberdade de decidir, mesmo correndo o risco de não acertar, a seguir a decisão dos pais. É decidindo que se aprende a decidir. Não posso aprender a ser eu mesmo se não decido nunca, porque há sempre a sabedoria e a sensatez de meu pai e minha mãe a decidir por mim. Não valem argumentos imediatista como: "Já imaginou o risco, por exemplo, que você corre, de perder tempo e oportunidade, insistindo nessa idéia maluca???" A idéia do filho, naturalmente. O que há de pragmático em nossa existência não pode sobrepor-se ao imperativo ético de que não podemos fugir. O filho tem, no mínimo, o direito de provar a maluquice de sua idéia. Por outro lado, faz parte do aprendizado da decisão a assunção das conseqüências do ato de decidir. Não há decisão a que não se sigam efeitos esperados, pouco esperados ou inesperados. Por isso é que a decisão é um processo responsável. Uma das tarefas pedagógicas dos pais é deixar óbvio aos filhos que sua participação no processo de tomada de decisão deles não é uma intromissão mas um dever, até, desde que não pretendam assumir a missão de decidir por eles. A participação dos pais se deve dar sobretudo na análise, com os filhos, das conseqüências possíveis da decisão a ser tomada.
A posição da mãe ou do pai é a de quem, sem nenhum prejuízo ou rebaixamento de sua autoridade, humildemente, aceita o papel de enorme importância de assessor ou assessora do filho ou da filha. Assessor que, embora batendo-se pelo acerto de sua visão das coisas, jamais tente impor sua vontade ou se abespinha porque seu ponto de vista não foi aceito.
O que é preciso, fundamentalmente mesmo, é que o filho assuma eticamente, responsavelmente, sua decisão, fundante de sua autonomia. Ninguém é autônomo primeiro para depois decidir. A autonomia vai se constituindo na experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas. Por que, por exemplo, não desafiar o filho, ainda criança, no sentido de participar da escolha da melhor hora para fazer seus deveres escolares? Porque o melhor tempo para esta tarefa é sempre o dos pais? Por que perder a oportunidade de ir sublinhando aos filhos o dever e o direito que eles tem, como gente, de ir forjando sua própria autonomia? Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém. Por outro lado, ninguém amadurece de repente, aos 25 anos. A gente vai amadurecendo todo dia, ou não. A autonomia, enquanto amadurecimento todo dia, ou não. A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. Não ocorre em data marcada. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiência respeitosas da liberdade.
Uma coisa me parece muito clara hoje: jamais tive medo de apostar na liberdade, na seriedade, na amorosidade, na solidariedade, na luta em favor das quais aprendi o valor e a importância da raiva. Jamais receei ser criticado por minha mulher, por minhas filhas, por meus filhos, assim como pelos alunos e alunas com quem tenho trabalhado ao longo dos anos, porque tivesse apostado demasiado na liberdade, na esperança, na palavra do outro, na sua vontade de erguer-se ou reerguer-se, por ter sido mais ingênuo do que crítico. O que temi, nos diferentes momentos de minha vida, foi dar margem, por gestos ou palavrões, a ser considerado um oportunista, um realista, um homem de pé no chão, ou um desses equilibristas que se acham sempre em cima do muro à espera de saber qual a onda que se fará poder.
O que sempre deliberadamente recusei, em nome do próprio respeito à liberdade, foi sua distorção em licenciosidade. O que sempre procurei foi viver em plenitude a relação tensa, contraditória e não mecânica, entre autoridade e liberdade, no sentido de assegurar o respeito entre ambas, cuja ruptura provoca a hipertrofia de uma ou de outra.
É interessante observar como, de modo geral, os autoritários consideram, amiúde, o respeito indispensável à liberdade como expressão de incorrigível espontaneísmo e os licenciosos descobrem autoritarismo em toda manifestação legítima da autoridade. A posição mais difícil, indiscutivelmente correta, é a democrata, coerente com seu sonho solidário e igualitário, para quem não é possível autoridade sem liberdade e esta sem aquela.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia, São Paulo, Paz e Terra, 2010.

domingo, 2 de janeiro de 2011

3 Álbuns - Álbum 1

Nos últimos dias fiz um resgate dos malditos, e de outros nem tão malditos assim, da música brasileira. Na verdade, vou confessar, alguns consagrados também. Um resgate de minha memória musical. Fui atrás de discos, bandas, interpretes... sons que conhecia e sons que ainda eram um tanto quando desconhecidos para mim.
Esqueci por algum tempo do “bom e velho rock’n’roll”, para usar uma frase clássica. E esqueci também de alguns músicos brasileiros muito caros para mim, tais como, Chico Buarque, Vinicius de Moraes, Tom Jobim, Baden Powell, Novos Baianos, Jorge Ben, Caymmi, Cartola e também Raul Seixas.

Agora gostaria de compartilhar com os possíveis leitores algumas maravilhas musicas ou até mesmo, pode-se dizer,  importantes manifestos contra-culturais, verdadeiros documentos históricos.
Serão 3 posts, cada um com um disco selecionado, tentando abranger a diversidade de música e artistas envolvidos utilizando de 3 classificações distintas.

Segue o primeiro:

OS MARGINALIZADOS

Escolhi o disco Revolver – não o bom, mas normalmente superestimado clássico álbum pop de 1966 – mas ao contrário, um álbum nacional, de 1975 do compositor Walter Franco. Este caracteriza os marginalizados da música brasileira. Isso mesmo, marginalizados, nem malditos são. A classificação se dá para certos discos que ficam a margem de qualquer adjetivo vindos da maior parte dos possíveis apreciadores. A margem seja por desconhecimento ou por descaso. Este álbum em especial, ao menos já teve algum reconhecimento, quando avaliado pela revista Rolling Stones (que fique anotado neste depoimento que não gosto desta revista), o colocando em quinquagésimo lugar na lista Top 100 Álbuns de Música Brasileira.

No álbum Revolver Walter Franco continua sua “Mixturação”! Esse é o título da primeira faixa de seu trabalho de estréia e me parece uma ótima definição para seu estilo, uma verdadeira mistura de sons. Essa atitude sonora o colocou sempre na vanguarda artística em seu tempo, mesmo não participando de nenhum movimento cultural musical tais como Bossa Nova ou mesmo o Tropicalismo.
Sobre do álbum: Seu título Revolver (não Revólver), pois segundo Walter Franco, “no princípio era o verbo”. Utiliza-se de muitas guitarras, o aproximando do rock, bem como elaborados efeitos de estúdio, mas mesmo assim fica claro que o disco não se prende a nenhum estilo de arranjo, mas está sempre buscando uma sonoridade diferente.