Nos dias atuais as aparências apresentam uma situação singular, não mais como o "fim de um sonho", comum aos anos setenta, com o fim do toda contracultura “sessentista”, mas podemos dizer, com um olhar superficial da sociedade, que já vivemos o início de um pesadelo. Falo daquele pensamento revolucionário de mudança social, política e econômica, por certo um desejo de transformação generalizada e em contexto mundial.
É comum vermos as pessoas que ainda cultivam esses ideais reclamarem por sentirem-se sozinhas em meio à maioria esmagadora que está entregue aos encantos da vida capitalista.
Uma pergunta sobre este tema foi parte integrante do texto em forma de entrevista elaborado (tanto as perguntas quanto as respostas) pelo filósofo francês Michel Foucault e por C. Delacampagne representante do jornal “Le Monde”, que encomendou o texto. O título foi “Le Philosophe masqué” (O filosofo mascarado), publicado em 06 de abril de 1980.
Foucault que solicitou não ser identificado na entrevista, por isso o título, respondeu a seguinte pergunta: “Você acredita que nossa época está realmente sem espíritos à altura dos seus problemas e dos grandes escritores?”
Vê-se que o problema já era relevante no início da década de 80 e sobre ele o pensador francês respondeu, de forma contraditória, que não acreditava no “refrão da decadência, da ausência de escritores, da esterilidade do pensamento, do horizonte negro e tétrico”. Exaltando a capacidade humana de manifestar a curiosidade, Foucault parece esquecer, mas penso que de forma intencional, com o intuito de destacar outro problema que tratarei em seguida, que nossa sociedade está absorvida pelo senso comum e pelo que Paulo Freire chama de “curiosidade ingênua”.
Não vou entrar no mérito do que é curiosidade ingênua, mas torna-se claro que ela é o que caracteriza o senso comum e dela resulta certo saber, mas sim, quero discutir o que é definido por Freire como “curiosidade epistemológica”, que é exatamente a curiosidade que Foucault destaca em seu texto. Esta caracteriza-se por ser mais metódica e mais rigorosa que a primeira, portanto uma curiosidade crítica por essência.
Ao exaltar a existência do pensamento crítico em nossa sociedade, algo que acredito que nos trinta anos passados diminuiu significativamente, Foucault procura nos alertar de outro mal, a minimização dos meios de disseminar-se informação. Segundo ele o “problema consiste em multiplicar os canais, as passarelas, os meios de informação, as redes televisivas e as radiofônicas, os jornais.”
Partindo deste principio necessário ao desenvolvimento da consciência humana, vemos já há algum tempo que a internet, as possibilidades abertas pela TI, podem tornar esses meios mais democráticos. No entanto, conforme John A. Mathews mostra em seu famoso artigo “New production concepts” (Novos conceitos de produção) de 1999, o qual discursa sobre a eminente mudança de paradigma de produção, essas novas ferramentas podem ser usadas para disseminar informação com o intuito de obter-se uma produção sustentável e flexível que deve ir além da organização do trabalho, passando pela mudança de aspectos técnicos, econômicos, políticos e sociais, ou simplesmente para automatização contínua de sistemas produtivos sem mudança na essência da organização do trabalho. Analogamente a esse conceito, vemos um dilema, utilizar a TI para verdadeiramente democratizar a informação, como pretende Foucault, ou para meramente intensificar a de caráter ingênuo, de marketing e visando a perpetuação do capitalismo exacerbado.
Para Foucault deve-se evitar “chamar mídia os canais de informação aos quais não se pode ou não se quer ter acesso” e a internet, diferentemente da maioria dos meios clássicos de mídia moderna, atente a este quesito. Portanto acho legítima a utilização da mesma, seja para pequenas ações, como o chamado “tuitaço”, por entender que é hora de a utilizarmos para o fim coerente com nosso sonho citado no começo do texto.
Gostaria de destacar mais uma frase do filósofo mascarado.
“Sonho com uma nova idade da curiosidade. Os meios técnicos existem; o desejo existe; as coisas a conhecer são infinitas; as pessoas que podem empenhar-se nesta tarefa existem. De que então sofremos? De escassez: canais estreitos, exíguos, quase monopolistas, insuficientes.” (Michel Foucault)
Fica agora a pergunta a ser respondida: Será que ainda sofremos desta escassez ou não sabemos utilizar os canais de informação disponíveis de forma coerente?
Referências:
FOUCAULT, Michel. Archivio Foucault. Vol. 3. Estetica dell’esistenza, etica, politica. A cura di Alessandro Pandolfi. Milano, Feltrinelli, 1994, pp. 137-144. Tradução portuguesa de Selvino José Assmann. Fpolis, setembro de 2000.
MATHEWS, John A. New Production Concepts. Prometheus, Vol. 7. No. 1, Junho de 1999.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia, São Paulo, Paz e Terra, 2010.
pergunta, o que tu acha que seria possível mudar nesse modelo de sociedade?
ResponderExcluircomo sempre disse: a educação!
ResponderExcluirleia o postagem que acabei de publicar, "Tempos Modernos", e entenda de que tipo de educação falo.