segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Assim é a vida do homem vista de fora – Por que Sustentabilidade?

Russell escreveu antes de mim um texto com o qual eu usaria para questionar essa nova (quase velha) onda chamada Sustentabilidade.
Com os mesmo argumentos, visando apresentar a pequenez humana, discursaria sobre qual o sentido de podarmos alguns de nossos desejos em prol de uma, duas ou dez gerações a mais de nossa sociedade; visto que mesmo com a utilização de um sem número de artinhas, um dia nosso fim inevitavelmente chegará.
Fiquem com o sempre bem escrito texto de Russell.

“Os sonhos de um homem ou de um grupo podem ser cômicos, mas os sonhos humanos coletivos, para nós que não podemos ultrapassar o círculo da humanidade, são patéticos. O universo é muito vasto, como revela a astronomia. Não podemos dizer o que existe além do que os telescópios mostram. Mas sabemos que é de uma imensidão inimaginável. No mundo visível, a Via Láctea é um fragmento minúsculo; e, nesse fragmento, o sistema solar é uma partícula infinitesimal, e, dessa partícula, nosso planeta é um ponto microscópico. Nesse ponto, pequenas massas impuras de carbono e água, de estrutura complexa, com algumas raras propriedades físicas e químicas, arrastam-se por alguns anos, até serem dissolvidas outra vez nos elementos de que são compostas. Elas dividem seu tempo entre o trabalho designado para adiar o momento de sua dissolução e a luta frenética para acelerar o de outras do mesmo tipo. As convulsões naturais destroem periodicamente milhares ou milhões delas, e a doença devasta, de modo prematuro, mais algumas. Esses eventos são considerados infortúnios; mas quando os homens obtêm êxito ao impor semelhante destruição por seus próprios esforços, regozijam-se e agradecem a Deus. Na vida do sistema solar, o período no qual a existência do homem terá sido fisicamente possível é uma porção minúscula do todo; mas existe alguma razão para esperar que mesmo antes desse período terminar o homem tenha posto fim à sua existência por seus próprios meios de aniquilação mútua. Assim é a vida do homem vista de fora.”

Nosso pensador usou este texto, que é parte integrante do livro “Ensaios Céticos”,  uma coletânea de ensaios, a maioria dos quais escritos nos anos 20, sobre os mais diversos assuntos e que continuam como polêmicas de nosso tempo, para defender sua posição contra a insanidade humana ao usar mitos para basear suas condutas.
Por mais diferentes que sejam nossos enfoques, temos algo em comum, a defesa do ceticismo. Quero deixar claro que mesmo que eu tenha alguma dúvida quanto ao nível de influência humana nos acontecimentos da natureza que vem sendo relatados pela mídia especializada ou não, ainda assim meu ceticismo estaria na pergunta, “por que sustentabilidade?” e não na afirmação – que aparentemente está errada – de que o homem pouco influi nesses acontecimentos.
Conforme o próprio Russell nos diz, para resolver o problema que nos é apresentado ao vermos o homem de fora, a humanidade apelou para a religião e a filosofia.
Para seguir a filosofia ceticista descartemos a religião em nossas exposições, abdicando no mito. Tomemos então a filosofia como base. Ela pelos mais diversos meios, seja, de forma humanista, materialista ou idealista, entre outras, responderá mais ou menos satisfatoriamente, evocando a necessidade de perpetuação da raça humana e a dignificação da vida; mas queira ou não, sempre baseada em crenças. Aí mora o grande problema, ao basear-se em crenças, normalmente o homem acaba cedendo ao imediatismo de sua vida cotidiana.
Hoje me parece que a sustentabilidade se insere neste imediatismo nas necessidades capitalista de demonstração da responsabilidade social e ambiental tanto do primeiro, segundo e terceiro setores da economia. As inclinações realmente filosóficas são deixadas em segundo plano, ou seja, os homens acabam guiados por suas necessidades imediatas e não no pensamento de uma sociedade a longo prazo, o que daria o sentido ético a questão.
Não quero aqui condenar a sustentabilidade, mesmo que ache que a tomada total e sem discussão de suas práticas, como é feito ultimamente, podem tornar em alguns casos a vida do homem mais triste, algo que é indesejável; mas quero sim, atentar para a utilização em massa de um conceito filosófico em prol de ganhos, não de ganhos a humanidade como um todo, mas a economia capitalista, economia que somente sede aos meios sustentáveis até onde vai seu interesse.

O Sistema de Copérnico - Quando a Terra perdeu a posição central, girando em torno do Sol, também o homem foi deposto de sua eminência.
Referências:
RUSSELL, Bertrand. Ensaios Céticos,  Pág. 32-33, Tradução de Marisa Motta. Porto Alegre, LP&M, 2010

Um comentário:

  1. O texto já começa bem escrito e muito inspirado, após várias prévias do assunto, que agora ganha forma.
    Penso que o texto do nosso, podemos dizer, quase íntimo Russell, cético em nossas verdades, mostra um dos grandes males da humanidade, de achar que somos maiores, mais poderosos, donos da natureza e do destino. Essa impressão humana, de acharmos que somos Deus, na linha filosófica de Feuerbach, ao transpor o poder que achamos que temos para uma imagem divina, tirando o peso de nossas atitudes, faz com que agimos muito rapidamente. É só pensar na revolução industrial até agora, relação de causa e efeito, ou seja, a sustentabilidade hoje é causa de algum efeito que se tornará mais um efeito. Acho que temos é que regredir, talvez tudo que acontece hoje deveria acontecer. Deveríamos voltar ao básico, parar de consumir. Ahhh, as vezes até sonho com o período feudal... as coisas lá parecem menos piores.

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