domingo, 13 de fevereiro de 2011

Tempos Modernos


Existe um grande movimento, encabeçado por nossa presidente da república, em favor da educação no país. No seu primeiro pronunciamento em rede nacional após a posse, a substituta de “nosso salvador” elegeu exatamente essa temática para discutir, apresentando suas propostas, e claro, sem esquecer-se de mencionar sua legítima luta contra a miséria.

Com seu plano, o qual foca em escolas técnicas, com abertura de novas instituições e financiamento de estudo ao molde das bolsas do ProUni, vê-se claramente uma retomada da já ultrapassada educação tecnicista, a qual vigorou no Brasil em especial nas décadas da ditadura.
Há diversas explicações, diga-se de passagem, muito claras, a respeito dessa preocupação, tais como, a extrema necessidade de mão-de-obra por parte do mercado de trabalho nacional; as centenas de milhares (milhões) de cidadãos disponíveis para ingressarem neste mercado, com o intuito de obterem rendimentos maiores, mas que antes precisam qualificar-se; a degradação, apontada há anos, em nossas escolas públicas; e por conseqüência disso, o desnível entre estudantes formados em escolas públicas e escolas privadas. Poderíamos continuar a lista, mas nos limitaremos as estes fatores.

Torna-se claro que se estes planos funcionarem, o ganho econômico e social será de grande valia à nossa população, ou seja, a medida que desenvolvo a educação de grande parte de uma nação, estarei atendendo as demandas do mercado de trabalho, e atendendo meu próprio povo. Resultado: desenvolvimento econômico; ganho no PIB; aumento do nível de renda; aumento do grau de escolaridade média; possível erradicação, muito bem vinda e tão almejada, da miséria; entre outros desdobramentos decorrentes destes.

Sem querer ser pessimista, mas atentando para as possibilidades, sabemos que este crescimento, ou melhor, desenvolvimento das infra-instruturas de nosso país, o qual é bastante necessário, não vai durar para sempre. Desta forma, o consumismo pregado em nossa sociedade, que só tende a crescer com o ganho educacional e de capital, não sustentará nossa economia. Digo isso observando as causas da ultima grande crise mundial, mas como mera especulação. Possivelmente este tema será objeto de uma postagem neste blog daqui há alguns anos.
Mantendo a perspectiva que alguns chamarão de pessimista, é importante lembrar que numa economia capitalista o preço é regulado pela oferta e demanda, portanto é provável que profissões que hoje pagam bem devido a falta de profissionais, daqui a alguns anos com o aumento da oferta destes no mercado de trabalho, o valor do salário tenda a cair.

Por fim cheguei a meu dilema: citando o romancista, dramaturgo e talvez mais importante filósofo do século XX, Jean-Paul Sartre "me posiciono do lado daqueles que querem mudar tanto a condição social do homem quanto a concepção que ele tem de si mesmo”(1946). O quero dizer com isso? Utilizando o ideário pedagógico dialético do pensador brasileiro Demerval Saviani (1986) gostaria de demonstrar que a escola não é lugar de criação de meras máquinas para o mercado de trabalho. A educação que deveria ser o instrumento para as escolhas do homem livre, democrático, cidadão e autônomo acaba, então se tornando mais uma ferramenta de manipulação e de minimização do pensamento crítico na sociedade. Ela legitima as diferenças sociais e marginaliza, ao invés de tencionar a luta contra a ideologia das classes dominantes, e dos direitos dos seres humanos: o conhecimento, que deve ser universal e possibilitado a todos.

Com essa análise, a crítica à escola tecnicista me parece simples e viável, pois conforme nosso teórico, o que devemos visar na relação entre a educação e a sociedade é a responsabilidade dos professores em transformar, não o mundo, mas sim cada indivíduo que assiste sua aula,  ajudando-o a compreender melhor os acontecimentos como um todo, assim como seu papel dentro do sistema, seus deveres e seus direitos. Somente desta forma é que construiremos o já anunciado, e a meu ver de modo equivocado, “país melhor”.


4 comentários:

  1. Realmente esta proposta já ultrapassada da nossa Presidenta de profissionalizar o ensino com escolas técnicas de “qualidade” não serve para nós.
    Não precisamos de ensino profissionalizante, queremos é de bons professores, desde a educação infantil, filósofos e didáticos capacitados; não precisamos de escola técnicas, queremos acesso a arte, cultura, espetáculos e discussões sociológicas e filosóficas. Sendo assim, estaremos verdadeiramente mudando a raiz dos problemas e desigualdade, não de forma superficial, imediata, para suprir uma necessidade da economia. Queremos a democratização dos conhecimentos, a escola é um aparelho ideológico de Estado, serve aos seus interesses, lembrando que o que desejamos é acabar com o Estado, mas ao mesmo tempo que ela manipula, ela possui as principais armas para a mudança social: o conhecimento. Nossa meta é democratizar os conhecimentos e buscar uma escola pública de qualidade para todos.
    A educação tecnicista ainda se faz presente com seus elementos, além do discurso ideológico contido no contexto atual, ainda temos o livro didático, antigas cartilhas ou apostilas, os laboratórios de ensino, como de ciências, artes, hoje de informática, o diretor escolar na representação de chefe, os professores específicos para cada matéria ou disciplina de ensino, fragmentando o conhecimento e ignorando a interdisciplinaridade dos assuntos estudados, transformando assim nossas cabeças em gavetas categóricas (ver Kant), os testes vocacionais, psicologizando e castrando os sujeitos, e o ensino médio profissionalizante, formando pessoas a serviço do Estado.
    Giorgia de Oliveira Moreira

    ResponderExcluir
  2. Muito bem escrito e muito bem colocado.
    Quando leio um comentário com toda essa propriedade que tem o seu, fico muito feliz.
    Mas não são somente comentários desta natureza que me alegram. A menor das observações e a mais contestadora das objeções me satisfazem da mesma forma.
    Estamos aqui para discutir e precisamos de mais pessoas como você para fazer isso.
    Muito obrigado pela participação e colaboração constante.

    ResponderExcluir
  3. "Em termos gerais, entendo que a tendência educacional atualmente dominante no Brasil, desde o final da década de 1960, é aquela que nós poderiamos chamar de concepção produtivista de educação." Saviani, pg 109.
    Existe um tal de Salm, que na década de 80 separa a educação (escola) do trabalho (processo produtivo), dizendo que as duas cisas são distintas. Mas porque elas acontecem simultaneamente então? A justificativa que Salm menciona é a formação da cidadania.
    Outra questão bacana para expor, seria que para Alceu de Amoroso Lima, (líder católico, escreveu uns dos principais livros pedagógicos da década de 30, Debates Pedagógicos) sendo a pedagogia a formação do homem, quer dizer, preparação para a vida e considerando que para se preparar é preciso saber para que, é necessário, na pedagogia, que haja previamente uma finalidade, um objetivo, um ideal a atingir. Daí que, para ele, o problema da pedagogia no Brasil é a ausência completa de um ideal educativo. (Saviani, pg 101)

    ResponderExcluir
  4. Me parece que este ideal citado no comentário anterior foi redescoberto na educação do Brasil, de uma forma torta e anti-ética: a formação de profissionais para o mercado de trabalho.

    Mesmo que este objetivo não possa ser entendido como um ideal, percebo que é ele que orienta todo um esforço para o desenvolvimento da educação em nosso país.

    O importante aqui é mostrar que a ideologia por trás de todo esse possível investimento educacional, ao contrário de visar o evolução intelectual de toda uma sociedade, a disseminação do democrática do conhecimento, o desenvolvimento de cidadãos com pensamento crítico , é atender as demandas da perpetuação da economia neo-liberal que cada vez mais se evidência no coração de uma nação enganada e totalmente alienada mediante ao incessante discurso psedo-social-democrata vindo de nossos representantes.

    ResponderExcluir